(11) 98020-0020 |

contato@bcco.com.br

(11) 98020-0020 |

contato@bcco.com.br

Tributação de Dividendos e Isenção de IRPF até R$ 5 mil: O que muda com a nova legislação (2026 em diante)

Uma das promessas centrais do Governo Lula III — a isenção de Imposto de Renda para pessoas físicas com renda até R$ 5.000 — avançou, foi aprovada pelo Senado e aguarda apenas a sanção presidencial. Para financiar essa renúncia fiscal, o legislador resgatou a tributação de dividendos, mecanismo já testado no passado e de resultados discutíveis. Apesar da controvérsia e da fragilidade histórica do modelo, sua implementação a partir de 2026 está praticamente consolidada.

O novo sistema altera profundamente a lógica de distribuição de lucros no país, introduzindo uma tributação mínima semelhante ao “global minimum tax” e criando impactos imediatos sobre planejamento societário, patrimonial e sucessório. A seguir, analiso as mudanças de forma integrada e narrativa.

A seguir, detalhamos de forma objetiva o que muda.


1. Tributação de Dividendos a partir de 2026

A partir de janeiro de 2026, lucros e dividendos pagos por uma mesma pessoa jurídica a uma mesma pessoa física residente no Brasil, em valor superior a R$ 50.000 por mês, ficam sujeitos à:

→ Retenção de IRRF de 10% na fonte, sobre o valor total recebido.

Sim: não é somente sobre o excedente. É sobre todo o valor.

Exemplo prático

Montante recebido no mês = R$ 50.000 = Sem retenção

Montante recebido no mês = R$ 51.000 = Retém-se 10% de 51.000 = R$ 5.100

Esse valor não é tributação definitiva (mas pode ser), a ser ajustada na declaração anual. Assim como nos salários hoje, pode gerar imposto complementar — depende da soma dos rendimentos tributáveis do ano.

! Nesse ponto é importante planejamento do contribuinte pois se o valor da tributação mínima ficar negativo, não é prevista restituições.

Importante: A retenção não atinge pessoas jurídicas brasileiras. Ou seja, dividendos entre empresas continuam isentos.


2. A controvérsia dos lucros até 2025

Talvez o dispositivo mais problemático da lei seja aquele que preserva a isenção para lucros apurados até 2025, desde que a distribuição seja aprovada até 31 de dezembro de 2025. A contradição é evidente: pela legislação societária, as empresas têm até abril de 2026 para aprovar as demonstrações financeiras de 2025. Exigir deliberação dentro do próprio exercício é inconsistente e sujeita interpretações divergentes.

Diante dessa insegurança normativa, a medida mais prudente é deliberar ainda em 2025 a distribuição dos lucros apurados naquele exercício.

Mesmo que não haja caixa no momento da distribuição, é possível distribuir e, posteriormente, devolver os valores via mútuo, operação que, embora sujeita a IOF, apresenta custo incomparavelmente menor do que a nova tributação dos dividendos.


3. Ajuste anual: tributação mínima para altas rendas

O IR retido nos dividendos é considerado antecipação e a tributação efetiva final será apurada no seguinte na Declaração de Ajuste anual. Assim, a partir do exercício de 2027 (ano-calendário 2026), pessoas físicas cuja soma de todos os rendimentos supere R$ 600.000 por ano ficam sujeitas à chamada → Tributação mínima do IRPF

Trata-se de regra semelhante ao “global minimum tax” aplicado internacionalmente.

A base inclui:

  • rendimentos antes sujeitos à tributação exclusiva (como CDB e fundos),
  • rendimentos antes isentos ou com alíquota zero (como dividendos e LCA), exceto os casos listados como exceções.

Ficam fora da tributação mínima:

(Lista preservada na íntegra conforme texto aprovado no Senado — apenas organizada)

  1. Ganhos de capital (exceto operações em bolsa com apuração de ganho líquido).
  2. RRA (Rendimentos Recebidos Acumuladamente) tributados exclusivamente na fonte.
  3. Doações e heranças (adiantamento de legítima).
  4. Poupança.
  5. Títulos imobiliários e de infraestrutura: LCI, CRI, LIG, LCD, FI-Infrastructure, FIP-IE/Fi-Infra, FIIs e FIAGRO com ≥100 cotistas etc.
  6. Títulos do agronegócio: CDA, WA, CDCA, LCA, CRA.
  7. CPR financeira negociada no mercado.
  8. Isenção rural prevista em lei.
  9. Indenizações por acidente de trabalho ou danos materiais/morais (exceto lucros cessantes).
  10. Rendimentos isentos previstos na Lei 7.713/88.
  11. Valores mobiliários isentos/zero (exceto ações/participações societárias).
  12. Lucros e dividendos relativos a resultados até 2025, desde que:
  • aprovados até 31/12/2025;
  • pagos nos anos 2026–2028 conforme ato de aprovação.

Vale observar que nessa conta não entram as deduções fiscais como gastos médicos. Na prática, as altas rendas perdem tais deduções!


3. Alíquota mínima aplicável

A alíquota cresce de forma gradual entre R$ 600.000 e R$ 1.200.000 ao ano. Para quem ultrapassa R$ 1.200.000, a alíquota mínima é de 10% sobre a base calculada. O imposto mínimo devido pode ser reduzido pelo IR já pago ao longo do ano (seja via retenções, seja via tributação exclusiva), mas não pode gerar saldo negativo a restituir. Se o mínimo calculado for inferior ao imposto pago, o contribuinte apenas zera a diferença — não recebe de volta.

→ Faixa 1: R$ 600.000 a R$ 1.200.000

Crescimento linear de 0% a 10%, conforme fórmula:

Alíquota (%) = (REND / 60.000) – 10

→ Faixa 2: Acima de R$ 1.200.000

Alíquota fixa de 10%.

Após calcular a tributação mínima, é possível deduzir:

  • IR devido no ajuste anual,
  • IR retido exclusivamente na fonte,
  • IR sobre aplicações financeiras específicas,
  • imposto pago definitivamente,
  • redutor (quando aplicável).

Assim as distribuições mensais devem ser planejadas.


Exemplo: contribuinte com R$ 750.000 de rendimentos em 2026

Considere uma pessoa física que, ao longo do ano, recebeu:

  • R$ 600.000 em salários;
  • R$ 100.000 em dividendos tributados;
  • R$ 50.000 em rendimentos financeiros.

Seu total de rendimentos tributáveis, para fins de tributação mínima, é de R$ 750.000.

A alíquota mínima aplicável é calculada pela fórmula: Alíquota = (REND / 60.000) – 10

Substituindo:

  • REND = 750.000
  • 750.000 / 60.000 = 12,5
  • 12,5 – 10 = 2,5%

Assim, sua tributação mínima é 2,5% sobre 750.000, totalizando R$ 18.750.

Suponha que essa pessoa já tenha pago, ao longo do ano, R$ 20.000 de IR (entre salário, dividendos e aplicações). Nesse caso, embora o imposto mínimo calculado seja menor do que o imposto já pago, o contribuinte não terá direito a restituição adicional, pois a lei impede saldo negativo para fins de tributação mínima. A única coisa que ocorre é o reconhecimento de que sua carga tributária mínima foi cumprida.


4. Atenção: dividendos não geram restituição

A lei é categórica:

→ Dividendos não geram saldo negativo a restituir.

Ou seja: Se a soma das retenções na fonte exceder o imposto final mínimo, o imposto é zerado, mas não há devolução do excedente.

Isso exige planejamento, sobretudo para quem recebe dividendos perto do limite mensal.


5. Dividendos pagos ao exterior

Tributação de dividendos remetidos ao exterior

Uma das mudanças mais profundas — e menos debatidas — foi introduzida na própria Lei 9.249/1995, que desde 1996 garantia isenção para dividendos pagos ao exterior. Essa lógica foi revertida.

O novo §4º do Artigo 10 estabelece que todo dividendo remetido ao exterior está sujeito à incidência de IRRF à alíquota de 10%, independentemente de o beneficiário ser pessoa física, pessoa jurídica, fundo estrangeiro, trust ou veículo de investimento. Trata-se de tributação definitiva, não ajustável por declaração anual.

Essa alteração afeta estruturas transnacionais, holdings estrangeiras, reorganizações societárias internacionais e grupos multinacionais que tradicionalmente operavam com repatriações isentas. Eventual mitigação poderá ocorrer via tratados internacionais — especialmente os que limitam a alíquota de dividendos a 5% ou 10% — mas os efeitos do novo regime serão amplos e imediatos.


6. Regra do redutor (anti–sobretributação PJ + PF)

O redutor: quando PJ e PF juntas pagariam mais do que a soma das alíquotas nominais

A legislação criou um mecanismo de “redutor” destinado a evitar sobretributação quando a soma da alíquota efetiva de IRPJ + CSLL da empresa que distribui lucros, somada à alíquota efetiva da tributação mínima da pessoa física beneficiária, ultrapassar os limites referenciais (34%, 40% ou 45%).

Um exemplo ajuda a ilustrar. Imagine uma empresa industrial com lucro contábil de R$ 10 milhões e IRPJ+CSLL pagos de R$ 3,8 milhões (alíquota efetiva de 38%). Suponha que um sócio receba R$ 2 milhões de dividendos e, pela tributação mínima, sua alíquota mínima efetiva seja de 10%. A soma das cargas (38% + 10% = 48%) supera os 34% aplicáveis às empresas em geral. Nesse caso, o sócio tem direito ao redutor, calculado sobre o excedente (48% – 34% = 14%) aplicado sobre o valor dos dividendos, reduzindo seu imposto mínimo até que a soma das duas cargas volte ao limite permitido.

Esse mecanismo, embora tecnicamente sofisticado, exigirá demonstrações financeiras consistentes e, para muitos contribuintes, um acompanhamento permanente da relação entre carga empresarial e carga pessoal.

Alíquotas-limite:

  • 34% – empresas em geral
  • 40% – seguradoras, capitalização, instituições listadas na LC 105
  • 45% – instituições financeiras (bancos)

O redutor é aplicado com base nos demonstrativos da empresa, que deverão ser apresentados conforme norma societária.

Há ainda opção de cálculo simplificado do lucro contábil da PJ, considerando:

  1. folha de salários e encargos;
  2. custo de mercadorias;
  3. matéria-prima e embalagem (industrial);
  4. aluguéis;
  5. juros de financiamentos;
  6. depreciação de equipamentos industriais.

A Receita Federal poderá, inclusive, pré-preencher o cálculo na própria declaração do contribuinte.

Exemplo completo: empresa no Lucro Real com carga efetiva de 42% e o impacto sobre o sócio

Para ilustrar a lógica do novo sistema, considere uma empresa industrial tributada pelo Lucro Real. No ano de 2026, ela apresenta lucro contábil de R$ 10 milhões. Após adições e exclusões fiscais, o lucro real tributável também resulta em R$ 10 milhões.

Ao final do período, a empresa recolhe:

  • IRPJ total (incluindo adicional): R$ 2.480.000
  • CSLL: R$ 1.720.000

O pagamento conjunto de IRPJ + CSLL soma R$ 4.200.000, resultando em uma alíquota efetiva de 42% sobre o lucro contábil — superior, portanto, à referência máxima de 40% prevista na lei para empresas do setor financeiro e segurador, e muito acima dos 34% normais aplicáveis às empresas em geral.

Após a tributação societária, a empresa distribui R$ 3 milhões de dividendos ao seu único sócio pessoa física residente no Brasil.

Pelo novo regime, se o sócio ultrapassar R$ 1,2 milhão no total de rendimentos do ano — incluindo dividendos — fica automaticamente sujeito à alíquota mínima de 10%. Nesse caso, os R$ 3 milhões entram integralmente na base da tributação mínima, que é calculada sobre todos os rendimentos do ano, e não apenas sobre os dividendos.

Suponha que o sócio tenha recebido ao longo do ano:

  • R$ 900 mil em pró-labore e rendimentos financeiros, e
  • R$ 3 milhões em dividendos.

O total é de R$ 3,9 milhões, sujeitando-o à tributação mínima máxima de 10%, resultando em um imposto mínimo devido de R$ 390 mil.

Contudo, ao aplicar a regra do redutor — criada exatamente para evitar que a soma da carga tributária da empresa e da pessoa física ultrapasse o limite das alíquotas nominais — percebe-se que a soma da carga efetiva (42% na PJ + 10% na PF = 52%) excede substancialmente o teto aplicável às empresas em geral (34%) e também o teto aplicável a instituições financeiras (45%).

Esse excedente é elegível à redução. Assim, a diferença (52% – 34% = 18%) é aplicada proporcionalmente sobre os dividendos recebidos. Se os dividendos foram de R$ 3 milhões, o redutor máximo potencial chega a R$ 540 mil, abatendo parte do imposto mínimo da pessoa física até que a soma das cargas volte ao limite permitido pela lei.

Esse exemplo mostra que, para empresas do Lucro Real que já pagam altos valores de IRPJ e CSLL, a lei cria uma espécie de “válvula de escape” para impedir dupla ou tripla tributação confiscatória. Em tais casos, o redutor tende a neutralizar boa parte da tributação adicional.


Mas o alvo real da lei não são essas empresas.

É importante destacar que empresas do Lucro Real que já enfrentam cargas efetivas elevadas — como indústrias, serviços intensivos em mão de obra e setores sem grandes incentivos — não são o foco principal da nova legislação.

A lei foi desenhada, em grande medida, para tributar:

  1. empresas que pagam pouco IRPJ no Lucro Real graças a incentivos fiscais, subvenções, créditos presumidos e regimes especiais;
  2. empresas do Lucro Presumido, onde a alíquota efetiva pode ser inferior a 10% em muitos setores;
  3. empresas do Simples Nacional, onde a carga total é frequentemente irrisória considerando margens altas e operações de faturamento limpo.

São nesses grupos — especialmente nos dois últimos — que o legislador identificou o maior “gap” entre o lucro distribuído aos sócios e o imposto efetivamente pago pela empresa. E é exatamente nesse ponto que a tributação dos dividendos acima de R$ 50 mil mensais e a tributação mínima anual para alta renda pretendem atuar.

Assim, embora a legislação seja ampla e tecnicamente complexa, seu efeito prático mais relevante será a recomposição da carga tributária de empresários de alta renda que atuam em regimes com imposição societária reduzida ou simbólica, principalmente no Lucro Presumido e no Simples Nacional, cujos lucros historicamente eram distribuídos com alíquota zero.


Conclusão: o que fazer agora

A aprovação final depende apenas da sanção presidencial, mas os efeitos já são imediatos para planejamento tributário.

As principais ações recomendadas:

1. Aprovar lucros de 2025 dentro do próprio ano de 2025, com data e critérios fixos.

2. Reavaliar políticas de distribuição mensal de dividendos para evitar retenções desnecessárias.

3. Modelar cenários de IR mínimo para pessoas físicas com renda total acima de R$ 600 mil/ano.

4. Reavaliar contratos de pró-labore, distribuição trimestral, holdings e acordos societários.

5. Simular impacto do redutor PJ+PF para grupos empresariais maiores